sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

Natal sem afectos... tocáveis





credits: unknown
via Google images


Natal

Não é só por ser
Natal
que aqui vos deixo
*
o meu jeito
*
de afecto e tanto
amar
neste tempo
*
sem preceito
*
Onde jamais o calar
faz do amar
nosso peito.


Maria Teresa Horta, Natal 2020


Que, apesar do vazio de afectos que enfrentamos, cada um de nós possa enfeitar este Natal, com o dom da resiliência, liberdade, solidariedade, fraternidade e esperança. 

E que possamos continuar a ter o privilégio de nos encantarmos com a as pequenas coisas que nos são permitidas, pois elas trazem-nos a redenção de tantas agruras. 


G-S


Fragmentos Culturais 


25.12.2020

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terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Eduardo Lourenço & a Música [1923-2020]

 



Eduardo Lourenço [1923-2020]

créditos: Lusa Barra

via Expresso

Morreu Eduardo LourençoProfessor catedrático, filósofo, escritor, ensaista, crítico literário, interventor cívico, tantas vezes galardoado e distinguido, 

Eduardo Lourenço foi e será um dos pensadores mais proeminentes da cultura portuguesa, internacionalmente conhecido. Um nome e uma obra que não cabem num apressado tributo. Voltarei a ele, mais tarde.

Hoje, no dia em que nos deixou, opto por um apontamento sobre a sua relação com a música, através do seu livro Tempo da Música, Música do Tempo.

Eduardo Lourenço tinha um especial gosto pela música. Uma relação intimista, mesmo. Vamos segui-lo um pouco:

"O que eu sou como ser mortal (o que todos somos), está contido na melancolia absoluta do allegretto da Sétima Sinfonia. Mas o que desejaria ser, o que não tenho coragem de ser, só se revela nesta Suite em Si Menor, de Bach."

Eduardo Lourenço, in Tempo da Música, Música do Tempo




Tempo da Música
Música do Tempo
Eduardo Lourenço
Gradiva, 2012

Tempo da Música, Música do Tempo que adquiri quando a Gradiva o publicou, em 1912.

Textos inéditos, retirados das páginas diarísticas de Eduardo Lourenço. Um conjunto de reflexões 'ocasionais' escritas pela audição da Música, em casa, ou em salas de concertos, rádio, discos.

"Auto-retratado na intimidade do seu escritório, nas viagens solitárias de carro, nas salas de concerto, nos teatros lotados, lugares privilegiados da sua audição, o autor revela um lado totalmente secreto da sua escrita."




Alban BergConcerto à mémoire d'un Ange
reprodução de manuscrito existente no Acervo Eduardo Lourenço
via Barbara Aniello

O autor revela a sua sensibilidade nos estados de alma ao ouvir trechos musicais bem como a sua imensa erudição, tornando possível o estabelecimento de relações surpreendentes entre as várias formas de expressão artística. 

"Da pintura à literatura, invoca contrapontos e analogias, iluminadores da essência da música e da alma humana."




Fernandp Rei da Nossa Baviera

Eduardo Lourenço

Imprensa Nacional / Casa da Moeda, Lisboa, 1986

via O Homem dos Livros (alfarrabista)

https://www.homemdoslivros.com/


Eduardo Lourenço foi distinguido com o Prémio Jacinto do Prado Coelho em 1986 pelo seu livro Fernando, Rei da Nossa Baviera, e recebeu-o pela segunda vez, com o livro Tempo da Música, Música do Tempo, em 2012.

"O Júri do Prémio Jacinto do Prado Coelho desse ano, salientou a diferença do livro Tempo da Música, Música do Tempo em relação às obras do autor anteriormente publicadas, não só por se tratar de um livro sobre música, mas também pela sua composição fragmentária, em forma de apontamentos soltos, por vezes inacabados, ou de breves notas de feição diarística" […] 

in Eduardo Lourenço, CNE




Entre Wagner e Mahler
(reprodução de manuscrito existente no Acervo Eduardo Lourenço)

via Barbara Aniello

Num percurso despido, um ser que acima de tudo deixa tranparecer sua alma e se redime através do que sente ao ouvir música:

"Diante desta torrente luminosa devia depor a minha velha pele, esta pele de que só a música me despe num instante, deixando-me nu e redimido, mas que no instante seguinte afogo em trevas. Delas só um Deus me poderia libertar. Digo Deus sabendo bem que esse absoluto que me atrevo a invocar é ainda o supremo álibi. É de mim, das ardentes seduções do meu profundo ser, que não quero ou de que não sou capaz de abdicar. Queria ir por um caminho de rosas para aquele sítio onde sei que me foi fixado encontro. E ninguém lá chega nunca sem antes morrer para si mesmo."


Eduardo Lourenço, in Tempo da Música, Música do Tempo


Poucos conheciam, antes da publicação do livro - com selecção e organização de Barbara Aniello, historiadora de arte e musicóloga - o longo convívio com a música de Eduardo Lourenço.


"A música, presença constante na sua vida e na sua actividade de pensador. Rádio, discos, concertos, festivais musicais. Tudo era ocasião para uma nova página nas pequenas agendas ou em papéis ocasionais" 






Agenda de bolso de Eduardo Lourenço
via Barbara Aniello


Numa caixa de papelão branco, afirma Aniello, encontravam-se inúmeras agendas de bolso e entre as páginas destes diários improvisados, havia anotações sobre música. 


Escritas entre 1948 e 2006, as 140 reflexões de Eduardo Lourenço sobre a música, quase todas inéditas, acompanham o inteiro arco temporal da sua carreira, abrangendo um leque vastíssimo de obras e autores, do gregoriano até à música serial, de Josquin de Prés a Stockhausen, de Bach a Bartók ou Berlioz.




Berlioz
(reprodução de manuscrito existente no Acervo Eduardo Lourenço)
via Barbara Annielo


"Inicialmente relutante, Eduardo Lourenço não queria tornar público um material tão marginal e fragmentado, declarando-se um simples amador. Todavia não é o seu rigor musicológico que se pretende aqui testemunhar, mas o lado intuitivo, agudo e iluminante de um pensador que respondeu por completo a todos os campos da sua vocação estética. Apesar de não ter formação específica na área, o escritor alcança a essência do discurso musical, traduzindo-o por vezes em forma de poesia, outras de ensaio, de fragmento, de aforismo anotado à margem de outras especulações."



Barbara Aniello, in Ler Eduardo Lourenço


G-S


Fragmentos Culturais


01.12.2020

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segunda-feira, 30 de novembro de 2020

A propósito do Dia das Livrarias e do Livreiro !




Libraire "Folies d'Encre" 
Montreuil, près de Paris
crédits: © Eric Piermont, AFP
via France24

"Quando alguém está numa leitura e levanta os olhos como se estivesse a apreender com muito mais intensidade o que acaba de ler, é esse o momento em que esse alguém fica totalmente envolvido, como se pensasse: «isto é meu, isto tem a ver comigo». Cada um tira da leitura o que necessita."

José Saramago

Em França, a revolta foi grande, quando o governo encerrou livrarias como lugar não essencial, durante as medidas mais duras de confinamento Covid, em Outubro e Novembro 2020.

Grandes artistas, escritores, actores, ilustradores revoltaram-se. E apoiaram a luta. Publicaram artigos de opinião, ilustrações pertinentes




Sauvons les libraries
crédits: Plantu

“Puisque les théâtres et les cinémas sont fermés, la librairie est le dernier endroit où on peut avoir accès à la culture”, 

Anne Martelle, SLF

Confesso que eu própria fiquei revoltada. Logo a França! Um país que dá ou dava - já não sei - muito valor à cultura. E sobretudo aos livros e à literatura, em geral.

“À une époque où on vit des moments d’isolement, de tension, le livre nous fait réfléchir sur l’importance de la lecture et de la compréhension de la vie humaine dans toutes ses composantes"

 Vincent Montagne, SNE 



 Librairie Les Guetteurs de vent (Paris 11e),le 29 octobre 2020

crédits: Agnès DHerbeys/ MYOP pour le Monde

A imagem é muito elucidativa. Olhemos a fila para pagamento, numa das livrarias francesas, em vésperas de reconfinamento no país.

Que seria de muitos de nós, se não tivessemos acesso aos livros. Bem sei que há livrarias virtuais, e a compra de livros online. 

Não é comparável! O gosto de entrar numa livraria, de admirar as estantes e mesas cheias de livros, de pegar em um livro, folhear, sentir o odor do papel, a espessura das folhas. E o gesto de virar a página, antes de seleccionar aquele livro que desejamos comprar. Incomparável. 

Tudo isto me leva a não comprar livros online.

Remetendo-me agora à nossa realidade. As livrarias não fecharam em momento algum durante os vários confinamentos. E são muito procuradas?

Infelizmente não. Dá tristeza ver algumas das mais conhecidas livrarias, muitas delas em centros comerciais, quase vazias. Nem assim. 




Livraria Leitura. a original, anos 70
Rua de Ceuta, Porto
via Público

Saudade das livrarias de rua. Livraria Leitura, a original, na cimo da Rua de Ceuta. Ou a Livraria Bertrand, a original, na rua de Santo António. Só para enumerar duas.

Prendem-se a elas grandes memórias afectivas. Muita gente ali leu e conviveu, tal como disse Manuel Alegre, quando a Leitura encerrou.




Livraria Leitura (antiga)
via Abril/ Sugestões Culturais

A Leitura era a livraria portuguesa mais aberta à diversidade. Os livros estrangeiros eram um mundo, a secção de poesia, admirável! 

Quem desejasse ler os últimos ensaios saídos em França ou em Espanha, tinha de ir à Leitura




Livraria Leitura & seu fundador Fernando Fernandes
Rua de Ceuta, Porto
ilustração Nuno Sousa
via blog largodoscorreios

A primeira Faculdade de Letras do Porto encontrava-se lá toda. Professores e alunos. E poetas, escritores, artistas, gente da cultura.

Procurávamos edições especiais, ou os chamados beaux livres, estrangeiros ou portugueses, que tinham na Leitura a sua montra de eleição. Oh! Saudade!




Livraria Bertrand, original
Rua 31 de Janeiro Porto
via AViagemdosArgonautas

A Livraria Bertrand que ainda conheci  (não nesta época) muito mais tarde, mas sempre na Rua 31 de Janeiro era outra referência.Aos sábados à tarde, toda a gente se encontrava lá. Ia lá miúda com os pais e irmãos e todos adorvamos ler, Cada um no seu género literário.


Mais tarde, fui encontrá-la num espaço muito pequeno mas com livros até ao tecto para onde se subia por alguns degraus e onde nossa cabeça quase encontrava o topo, num shopping. na zona da Boavista. Acolhedor, sempre bastante gente. pequenas mesas cheias de livros, bem seleccionados e nas estantes das paredes, em volta do espaço, e no andar de cima, um pouco de todos os géneros literários.




Bertrand Livreiros

Hoje, a grande Livraria Bertrand, aberta no mesmo espaço de uma outra Livraria Leitura mostra-se como um armazém de livros, onde a escolha e o atendimento nada têm a ver com os verdadeiros livreiros que conheci.

As livrarias estão vazias. Singularmente vazias. Não há pessoas a comprar livros. E são muito poucas as que entram. Nem que seja para dar uma vista de olhos, ou saber das últimas publicações.

Tristemente, os livros aguardam em silêncio, fechados, alinhados, nas mesas ou estantes. Poucos os valorizam. 

E para ser sincera, os colaboradores que deveriam fazer um atendimento responsável, não fazem nada para atrair o cliente, leitor frequente ou não. Muitas vezes indiferentes. 




Livraria Almedina (antiga)
Arrábida
via Booktailors (desactivado)

Saudades igualmente da antiga Livraria Almedina, num outro centro comercial, onde ia ver e comprar algumas das mais recentes novidades literárias, após uma sessão de cinema, ao sábado, final de tarde. Sempre cheia. 

Ou da 'antiga' Livraria Bertrand que funcionou, como já escrevi, durante muitos anos num pequeno espaço, num centro comercial da cidade. Sítio acolhedor, pequeno, e cheio de livros até ao topo. Aí, tantas vezes encontrei Agustina Bessa-Luís, quase tão assídua quanto eu. 

Os colaboradores saudavam a entrada dos leitores, conheciam os mais frequentes, alertavam para as últimas publicações. 

E atentos aos nossos gostos e escritores preferidos, tinham a delicadeza de mostrar este ou aquele livro/ autor posto de lado, com a ideia de nos poder interessar.  E acertavam.




Estórias com Figuras
Antonio Tabucchi
Dom Quixote, Agosto 2020

Acabou a delicadeza no atendimento, a atenta postura perante o leitor que entra. Indiferença quase total. E em certos momentos, quase nos fazem o favor de vender um livro.

A semana passada, talvez, fui comprar, em momentos diferentes, dois livros que sairam há pouco tempo. Autores que não dispenso. 

Antonio Tabucchi, Estórias com Figuras (1943-2012), um livro de contos que parte das pinturas que o escritor admirava.

«Creio poder afirmar que a pintura entrou fortemente na minha escrita. Entrou como estímulo, como insinuação, também um pouco como encantamento, e também um pouco, amiúde, como ditado de textos que escrevi." 

Antonio Tabuccchi

Uma viagem onírica entre recordações e atmosferas poéticas com obras de Paula RegoGraça Morais, entre muitos outros.




Quichotte
Salman Rushdie
Dom Quixote, Setembro 2020

Comecei há pouco a ler, juntamente com Quichotte de Salman Rushdie. Tal como Cervantes escreveu Dom Quixote para satirizar a cultura do seu tempo, Rushdie transporta-nos numa desvairada corrida através de um país à beira do colapso moral e espiritual.

"Inspirado pelo clássico de Cervantes, Sam DuChamp, um medíocre autor de livros de espionagem, cria Quichotte, um cortês e apatetado vendedor ambulante obcecado pela televisão que é vítima de uma paixão impossível por uma estrela de TV."




Bertrand Livreiros

Livraria Bertand actual, no mesmo centro comercial, em frente ao antigo espaço  que foi largamente esmagado, então, pela imensa Leitura. 

Hoje, espaço mais parecido com um armazém de livros. Nada acolhedor, má apresentação dos livros, selecção muito desajustada de assíduos e mais cuidadosos leitores. Atendimento frio, desinteressado, quase nos dá vontade de virar costas ao desejo imenso de comprar o livro que já levamos em mente.




créditos: Público

Serve esta postagem para celebrar o Dia das Livrarias e do Livreiro, que hoje se celebra. Inspiração vinda de Espanha, trazida por José Saramagoassinalando o aniversário da morte de Fernando Pessoa e de Fernando Assis Pacheco - de alerta para os livreiros. Um maior cuidado na selecção ou formação dos seus colaboradores?

Por que não investir em estudantes universitários dos cursos de Letras? Estudam literatura, valorizam os livros, estão informados sobre livros e seus autores. 

Se não, as livrarias vão acabar por morrer, asfixiadas de livros que não saem das prateleiras. 

Era suposto as pessoas em confinamento agarrarem-se mais à leitura. Em Portugal, são poucas. Por muito que as escolas façam para incentivar os jovens para a leitura, não se vêem resultados nítidos.


“É um sinal dos tempos, em que o livro anda para trás e o mundo não anda para a frente sem livros”

Manuel Alegre


G-S

Fragmentos Culturais

30.11.2021

actualizado 30.11.2022

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sábado, 31 de outubro de 2020

Blue Moon, numa noite especial !





Blue moon full Halloween
credits: Shutterstock
via New York Times

"The moon remains, perpetually and since antiquity, a source of cultural wonder."

Nunca se viu tanto céu como agora. Será que estamos mais sensíveis ao que se passa lá no alto? Ao momento em que o sol se deita? Ou à Lua Cheia que se apresenta nítida, brilhante, na noite, desde ontem?

Pois esta noite, 31 Outubro, Halloween night, a Lua Azul vai ser visível. É a primeira Lua Azul visível em todo o mundo desde 1944. Na noite de Halloween ? Wow. Vão despertar os rituais.

Uma Lua Azul acontece só em certos momentos. Isto é, quando há mais do que uma Lua Cheia no mesmo mês. Não porque seja azul. 

E Luas Cheias de Halloween são ainda mais raras. Só acontecem de 18/ 19 anos.

A lua vai ter um significado especial! Claramente! Para muitos. 

Abdicamos de saídas, de concertos, de cinemas, quase todos em centros comerciais, de jantarmos aqui ou acoli. Ficámos com mais tempo para apreciar as coisas belas da natureza.

Sempre lá estiveram, mas no meio da dispersão, não olhávamos com tanta atenção. E sensibilidade.

Vamos então estar atentos, já que semi-confinados, olhando o firmamento, numa noite especial. E por que não, ouvindo...


Blue moon,
You saw me standing alone,
Without a dream in my heart,
Without a love of my own.

Billie Holiday


Wow! Blue Moon! Billie Holiday.

A natureza compensa-nos. E a música enche-nos a alma. Talvez tenhamos ficado mais sensíveis ao essencial.


G-S


Fragmentos Culturais


31.10.2020

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quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Dia Internacional da Música : Juliette Gréco, a Musa do Existencialismo

 




Juliette Gréco {1927-2020]
créditos: © Picture Alliance/DPA/ABACA
via Elle.fr

"Une grande dame s’est éteinte. Le mercredi 23 septembre, la chanteuse et actrice Juliette Gréco est décédée. (...) Sa vie fut hors du commun"

AFP

Morreu a musa do Existencialismo, também conhecida como "la muse de la Rive Gauche."

"Elle fut la muse du Saint-Germain-des-Près de l'après-guerre."

Le Monde

Juliette Gréco, ícone da música francesa. Cantou Léo Ferré, Jacques Brel, Jacques Prévert e Serge Gainsbourg.

Sempre vestida de preto, cabelo com franja, e eyeliner preto "aux yeux de biche"Era descrita habitualmente assim, quando se referiam à "Gréco"





Juliette Gréco
crédits: © R. Dumas
via Elle.fr

"The songs are “like little plays,” (...) “They’re typically French. We’re a people who express our love in songs, our anger in songs, even our revolution in songs.”

Juliette Gréco, The New York Times, 1990

Nascida a 7 Fevereiro 1927, à Montpellier, França, Juliette Gréco, cresceu perto de Bordeaux, criada pelos avós maternos, após a separação dos pais. Nos anos 30 foi para Paris, para se juntar à mãe e irmã.

"Passionnée de danse, elle devient, dès l’âge de 13 ans, petit rat de l’Opéra de Paris".

Na sua autobiografia, publicada em 1983, "Jujube", diminutivo de infância, Gréco conta como, após a detenção da mãe, que pertencia à Résistence, esteve presa durante 10 dias em Fresnes, em 1943, com a irmã mais velha, Charlotte. A mãe e a irmã foram deportadas para o campo de concentração de Ravensbrück, na Alemanha, mas sobreviveram.





Je suis faite come ça
Juliette Gréco
Flammanrion, 2012

"Sans détour, elle évoque les meurtrissures de son emprisonnement à Fresnes, la déportation de sa sœur et de sa mère..." 

Juliette Gréco, Je suis faite comme ça







Juliette Gréco voltou a Paris e aí permaneceu. Ganhou voz, mostrou-a a quem a quis ouvir, até que chamou a atenção de quem a via. E acabou por se impor com elegância, o que a levou a tornar-se um ícon.

Resistente improvável, deu voz a poemas de intervenção, descobriu o seu próprio
caminho na canção francesa. Tornou-se mais tarde num símbolo engagé da chanso française.

Voz grave. fumada, adquirida pela boémia parisiense. 






Juliette Gréco ganhou um lugar diferente na boémia parisiense, devido à sua sensibilidade, ora melancólica e dramática, ora despreocupada e pouco dada a regras.

"Juliette Gréco se livre et se souvient. Les cafés au Flore avec son ami Maurice Merleau-Ponty et les soirées en compagnie de Boris Vian ; ses premiers essais au théâtre, les concerts dans des salles mythiques, de Bobino à l'Olympia, et la conquête de l'Amérique..."

Juliette Gréco, Je suis faite comme ça

A actriz e cantora francesa era o rosto e a voz do Paris radical chic do pós-guerra. 

No final dos anos 40, Raymond Queneau e Jean-Paul Sartre assinaram os primeiros êxitos de Juliette Gréco no cabaret Le Tabou: “Si tu t’imagines” e “La Rue des Blancs-Manteaux”.

Viveu com  Darryl F. Zanuck, Hollywood, bem como com a lenda do jazz, Miles Davis.

"Charlie Parker, Miles Davis, Prévert, Queneau, Gainsbourg, Sagan... Juliette Gréco raconte ses révoltes et ses engagements, refusant de se parodier et de s'enfermer dans le mythe."

Juliette Gréco, Je suis faite comme ça



Juliette Gréco 
via Flip Magazine

Juliette Gréco, cantou Léo Ferré, Jacques Prévert, Serge Gainsbourg. Cantou também Pierre Desnos, Bertolt Brecht, Boris Vian, Françoise Sagan, Charles Aznavour, Guy Béart, e Georges Brassens.

"Ce sont les mots qui dictent le geste, jusqu'au bout des doigts" 

Juliette Gréco




Os verdadeiros apreciadores de Gréco lembram temas como "Jolie môme" (1961), La Javanaise (1963), e alguns anos mais tarde, Déshabillez-moi (1967). Títulos que evocam os grandes clássicos da chanson française

Celebrizada pela sua interpretação de Belfegor (1965), na série televisão epónima, a cantora da Rive Gauche estreou-se no teatro em 1945, em “Victor ou les enfants du pouvoir”, e no cinema em 1949, em “Orphée”, de Jean Cocteau.






Foi casada, entre outros, com o grande actor francês Michel Piccoli que morreu recentemente, em Maio 2020.




Juliette Gréco & Michel Piccoli
crédits: Keystone-France\Gamma-Rapho/ Getty Images

Em Portugal, actuou por duas vezes, em 2001 e 2008, ambas no Centro Cultural de Belém (CCB). Na Casa da Música, teve dois concertos agendados em 2008. Foram anulados "por motivos de força maior."




Juliette Gréco
crédits: Leszek Szymanski (EPA/Lusa)

Em 2013, voltou a Lisboa, no dia em que completava 86 anos, não para cantar, mas para ser homenageada no Instituto Franco-Portugais, por ocasião do lançamento da colecção Chanson Française, editada pelo diário Público com selo da Levoir e da Le Chant du Monde.

Com uma carreira repartida pela canção e o cinema, com passagens por Hollywood, Gréco tornou-se a "diva" da chanso françaiseRecebeu em 2012, as insígnias de Commandeur de la Légion d'honneur, entre outras distinções.




Juliette Gréco

crédits: Victor Diaz Lamich, 2006/ via Wikipedia

Quando Juliette canta e recita os versos: "Com o tempo tudo passa, também os amores vão embora e ninguém os espera mais", ela parece sugerir que o tempo apaga muitas coisas, os amores sem dúvida, mas deixa em todos nós as coisas mais belas, inesquecíveis, intemporais. Como sua voz, além da memória de uma Paris que foi o centro do mundo e, sob aquele céu, a cultura inspirou homens de boa vontade."


"Pour résister à l’approche de la fin, il faut aimer ce qu’on fait, à la folie, aimer son métier comme je l’aime moi, c’est-à-dire de façon démesurée, hors normes, en allant chanter aussi dans des petites salles de banlieue en matinée et savourer qu’un jeune homme ait dit à la fin du tour de chant : Elle est bonne, hein, Gréco ! 

Le Monde

Bravo Juliette!


Neste Dia Internacional da Música, meu tributo a Juliette Gréco!

G-S

Fragmentos Culturais

01.10.2020
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