domingo, 22 de dezembro de 2019

Natal : Tempo transfigurado !






créditos: Getty Images
via The Points Guy


"Natal. E, só pelo facto de o ser, o mundo parece outro. Auroreal e mágico. O homem necessita cada vez mais destas datas sagradas. Para reencontrar a santidade da vida, deixar vir à tona impulsos religiosos profundos, comer e beber ritualmente, dar e receber presentes, sentir que tem família e amigos, e se ver transfigurado nas ruas por onde habitualmente caminha rasteiro. São dias em que estamos em graça, contentes de corpo e lavados de alma, ricos de todos os dons que podem advir de uma comunhão íntima e simultânea com as forças benéficas da terra e do céu. Dons capazes de fazer nascer num estábulo, miraculosamente, sem pai carnal, um Deus de amor e perdão, contra os mais pertinentes argumentos da razão."



Miguel Torga,  in 'Diário (1985)


Felizes Festas! 

G-S

22.12.2019

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domingo, 15 de dezembro de 2019

Anna Karina : O icon da Nouvelle Vague






Anna Karina [1940-2019]
créditos: Getty

« Tu me parles avec des mots, moi je te regarde avec des sentiments »

Pierrot le Fou, Jean-Luc Godard


A actriz Anna Karina, eterna musa de Jean-Luc Godard, símbolo da Nouvelle Vaguemorreu ontem, dia 14 Dezembro, em Paris.

De uma beleza ímpar, Anna Karina, de origem dinamarquesa, viu a sua carreira ascender rapidamente nos anos 60. 

Hanne Karin Bayer, seu verdadeiro nome, começou a sua carreira, embora menor, como manequim na casa de alta costura, Coco Chanel. Foi aí que lhe deram o nome de  Anna Karina


Tinha apenas 18 anos quando chegou a Paris, vinda da Dinamarca de auto-stop, cheia de sonhos para ser a
ctriz. Uma franja acastanhada e uns imensos olhos azuis. Lindos!






Anna Karina & Jean-Luc Godard, 1963
credits: Jack Garofalo/ Getty Images

Alguns anos mais tarde, não muitos, Anna Karina realizava o sonho. Tornou-se um dos ícones mais célebres da Nouvelle Vague

Nos anos 60, fez sete filmes con o realizador Jean-Luc Godard, com que esteve casada (1961). Pierrot le Fou, um dos filmes marcantes. A sua frase « Qu’est-ce que j’peux faire, j’sais pas quoi faire ») ficou eternizada. 

Outros filmes como Bande à part com esta cena marcante:







Karina era ainda casada com Godard, quando ganhou o prémio de Melhor Actriz no Festival de Cinema de Berlim, pela sua interpretação em Une femme est une femme, em 1961. Tinha apenas 21 anos.

"I was the youngest actress to win the Best Actress award at the Berlin festival. Everybody was talking about me, and my mother was very proud."

Anna Karina





Une Femme est une Femme
Jean-Luc Godard, 1961

Participou como musa inspiradora em mais de sessenta filmes, entre os quais, Une femme est une femme e Pierrot le fou com Jean-Paul Belmondo.

Trabalhou também com Agnès Varda, Chris Marker, Roger Vadim, Luchino Visconti ou Jacques Rivette.

"Anna est partie hier dans un hôpital parisien (...) C'était une artiste libre, unique"

Laurent Balandras, seu agente







Anna Karina
via Cinemateca

Actriz aclamada, foi a musa inspiradora de muitos dos filmes de Jean-Luc Godard. Mas sobretudo o símbolo da Nouvelle Vague.

Anna Karina fez também carreira como cantora. Podemos ouvi-la em várias bandas sonoras originais como Une femme est une femme (1961), Bande à part (1964) e La Religieuse de Jacques Rivette (1966).







Serge Gainsbourg compôs a banda original do télé-filme Anna no qual Anna contracena com Serge Gainsbourg e Jean-Claude Brialy (1967). Aí interpreta o êxito "Sous le soleil exactement". 








A morte desta grande senhora do cinema despoletou, de imediato, homenagens
vindas de todo o mundo, nos jornais, e redes sociais. A mágoa, tristeza, dos conhecedores de cinema, e de personalidades de várias vertentes do mundo das artes e cultura






Anna Karina

Franck Riester, ministro da Cultura França, manifestou na sua conta do Twitter a sua imensa tristeza e prestou homenagem a Anna Karina:

"Son regard était le regard de la Nouvelle Vague. Il le restera à jamais. Chez Godard surtout, mais aussi Rivette ou Visconti, Anna Karina irradiait ; elle magnétisait le monde entier.

Aujourd'hui, le cinéma français est orphelin. Il perd l'une de ses légendes."






Anna Karina
Pierrot le fou

Sem dúvida! Anna Karina para além da sua beleza, representa, é o símbolo do movimento do cinema francês que ficou conhecido como Nouvelle Vague.

“After all, things are what they are. A message is a message, plates are plates, men are men, and life is life.”

Anna Karina

G-S

Fragmentos Culturais

15.12.2019
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quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Jorge de Sena & Sophia Mello B. Andresen : dois enormes vultos da Cultura Portuguesa !






Jorge de Sena | Sophia de Mello B. Andresen
créditos: RTP

Jorge de SenaSophia de Mello Breyner Andresen celebram o seu Centenário nos primeiros dias de Novembro. Jorge de Sena nasceu no dia 2 Novembro 1919 em Lisboa. Sophia nasceu neste dia, 6 Novembro, mas no Porto.





Jorge de Sena
créditos: fotografia Eduardo Gageiro

Sobre Sophia e Sena já escrevi. Jorge de Sena, a propósito da transladação dos seus restos mortais para a Pátria, Portugal (2009). Sophia Mello Breyner. quando seus filhos doaram o Espólio de sua mãe à Biblioteca Nacional de Portugal (2011).

"Assim, no presente, porque é preciso resistir “um pouco mais à morte que é de todos e virá” e, mesmo que se morra, “o poema encontrará uma praia onde quebrar suas ondas”. 

Eles são Jorge de Sena e Sophia de Mello Breyner Andresen e aqui contam-se as suas histórias, as suas conversas, recorrendo também às palavras escritas pelos próprios, que a "vida é melhor em cartas e versos."





Jorge de Sena
créditos: fotografia: Fernando Lemos 
via Público

cem anos nascia, em São Jorge de Arroios, Lisboa, Jorge Cândido de Sena. Formado em engenharia, mas apaixonado pela escrita, é considerado um dos maiores poetas portugueses do século XX e uma personalidade incontornável no panorama cultural da época.

Esta é a ditosa pátria minha amada. Não.
Nem é ditosa, porque o não merece.
Nem minha amada, porque é só madrasta.
Nem pátria minha, porque eu não mereço

A pouca sorte de nascido nela. 

Sena, A Portugal

Tem uma vasta obra como poeta, ficcionista, crítico ensaísta, historiador, tradutor e diversas outras áreas ligadas às disciplinas humanistas. É tido como um dos mais influentes intelectuais portugueses do século XX.

Procurou exílio no Brasil, foi professor universitário nos Estados Unidos, para onde se mudou em 1965.

Regressou a Portugal depois do 25 de Abril, mas a estadia foi curta. A relação com Portugal, a sua pátria, seria sempre complicada, tal como o próprio referia na sua poesia:

 “porque eu não mereço a pouca sorte de ter nascido nela“.

Jorge de Sena





Sophia Mello Breyner Andresen
créditos: Autor não identificado
via Portal da Literatura

Sophia nasceu no Porto, neste dia, 6 Novembro 1919. Foi no Porto que passou a infância. Estudou Filologia Clássica na Universidade de Lisboa. Publicou os primeiros versos em 1940, nos Caderno de Poesia. 

Sophia de Mello Breyner Andresen tinha um amor inexplicável pelo mar e o dom da palavra, decerto antes de sequer esboçar a primeira. É o vasto espólio de palavras, poemas e textos que estão a ser celebrados ao longo deste ano com eventos que se prolongarão até ao fim de 2019.

Escreveu também contos, artigos, ensaios e teatro. Traduziu Eurípedes, Shakespeare, Claudel, Dante e, para o francês, alguns poetas portugueses.
Nas celebrações do Centenário em honra da poeta, houve espectáculos, colóquios, exposições, leituras, concertos, prémios, filmes sobre a vida e a herança de uma das autoras mais marcantes do século XX em Portugal e no mundo. Sophia.

Dois do maiores nomes da cultura e literatura portuguesa. Jorge de Sena, o "intelectual indigesto" da cultura portuguesa como alguém lhe chamou, foi poeta, crítico, ensaísta, ficcionista, dramaturgo, tradutor e professor universitário. Prefiro a expressão " crítico temerário":

"Como escritor temerário que sempre foi, e sentindo-se “outcast de grupos literários e profissionais”, Sena falou de tudo, de todos e da maneira que entendeu ser a certa, mesmo que por vezes tenha sido desagradável ou agressivo."


"Há mesmo quem compare as várias e justas celebrações do centenário de Sophia de Mello Breyner Andresen com as escassas iniciativas a propósito do centenário de Jorge de Sena, quatro dias mais velho do que Sophia."
Francisco Sarsfield Cabral


Sophia de Mello Breyner
Jorge de Sena
Correspondência 1959-1978

Considerados dois dos maiores poetas portugueses do século XX, mantiveram em vida uma profunda amizade que ficou registada, entre outros escritos, na correspondência regular, desde o final dos anos 1950, após o exílio de Sena, e que constitui não só uma obra da literatura e da estética, como um retrato da época, até aos anos 1970.

"A verdade é que Sophia e Sena eram admiradores mútuos e grandes amigos. Em 2006 foi publicado um livro (ed. Guerra & Paz) bem interessante, com a correspondência entre ambos."

Francisco Sarsfield Cabral

Não vou alongar-me. Há imensos artigos, colóquios e outros eventos interessantes que aconselho vivamente. 

Pretendo apenas prestar a minha singela homenagem a estes dois grandes escritores que estudei na Faculdade de Letras da U. Portoe partilhei mais tarde o gosto e a admiração com os mais jovens. 

Lamento o facto de não ter sido feita uma homenagem a Jorge de Sena. Teria tidp todo o direito a ela. Apenas pequenas homenagens, Colóquio de Letras nº 200 da Fundação Gulbenkian e Centenário Jorge de Sena de FEUP





O Físico Prodigioso
Jorge de Sena, 1964
Edições 70

"No ano do seu centenário, a FEUP associa-se às comemorações oficiais deste nome maior da literatura portuguesa com uma Maratona Literária. Haverá melhor forma de celebrar este autor, que é também um dos mais prestigiados alumnus FEUP, e por isso mesmo considerado por nós o Escritor da Casa?"

FEUP, Centenário Jorge de Sena

"Nesta obra, mais uma vez Jorge de Sena se nos revela como escritor plural, criando um ambiente medieval, religioso e mítico, evocando cantigas de amigo e sublimando um texto marcado pelo erotismo, breve marca do humano, punida pela moralidade vigente."

Duas notas finais, sobre duas obras, uma de cada autor. Admiro os dois, muito. Diferentemente. Mas são dois dos meus autores mais queridos.





Sinais de Fogo
Jorge de Sena
Guimarães Editores

Sinais de Fogo, único romance, publicado inacabado, um ano após a morte do autor, em 1979. de uma força pujante que retrata a sociedade burguesa dos finais da 1ª metade do Sec. XX. 

É considerado a obra-prima deste que é um dos nomes maiores das letras portuguesas. Jorge de Sena

A acção desenrola-se predominantemente na Figueira da Foz, quando eclode a Guerra Civil em Espanha. 

"Sinais de Fogo" abriga em si o despertar de um jovem, entre um grupo de amigos e familiares, para a sexualidade, a política e a poética. De uma erudição e de um rigor literário inexcedíveis, aqui se fixa um olhar sobre o ano de 1936 português, tendo como pano de fundo o início da Guerra Civil de Espanha.

Um jovem estudante, Jorge, vai passar as férias de Verão a casa do seu tio Justino, na Figueira. 

"Quando cheguei à Figueira, a estação era um tumulto de espanhóis aos gritos, com sacos e malas, crianças chorando, senhoras chamando umas pelas outras, homens que brandiam jornais, e uma grande massa de gente comprimindo-se nas bilheteiras."

É com frequência considerado um romance autobiográfico.





Musa
O Búzio de Cós
E Outros Poemas
Sophia Mello Breyner Andresen
editora Assírio & Alvim

”Musa e O Búzio de Cós e outros Poemas”, os dois últimos livros de poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen, publicados na década de 90, formam uma unidade de duas faces e constituem um fecho, um ponto de chegada que funciona como uma espécie de coda. 

"A junção dos dois livros na presente edição abre uma perspectiva de leitura da fase final da obra da poeta e activa, naturalmente, um impulso interpretativo que nos leva a focar a obra na sua globalidade. […] Aqui, com variações, os temas e os motivos de sempre: a exaltação do esplendor do mundo, a praia atlântica, o sul, a Grécia, a denúncia do que é fácil e falso, a escrita do poema, a forte afirmação vital, a fidelidade à palavra, a crença absoluta na poesia…"

Lamentavelmente,  Jorge de Sena não teve direito a Centenário a nível nacional, como teve Sophia.




Colóquio Letras 200
Jorge de Sena
Janeiro 2019

Há, no entanto, eventos dispares, isolados importantes! Jornada Jorge de Sena na Gulbenkian com a publicação nº 200 da Revista Colóquio Letras.

O lançamento foi marcado por uma conferência, na qual especialistas portugueses e brasileiros repensaram, à luz do século XXI, a obra multifacetada do autor de Sinais de Fogo, segundo informação disponibilizada pela Gulbenkian.

Já em 1988, a Colóquio de Letras no duplo nº 104-105 prestou Homenagem a Jorge de Senna.

Na Biblioteca de Portugal o Colóquio A Crítica de Jorge de Sena que terá lugar de 6 a 8 Novembro 2019.





Colóquio A crítica de Jorge de Sena
BN Portugal

"O colóquio pretende discutir, durante três dias, a produção ensaística de Jorge de Sena, actividade tão profícua quanto a de poeta, como aliás o próprio reconhece num depoimento que escreve em 1976 («O poeta e o crítico na mesma pessoa – um depoimento sobre algumas décadas de experiência pessoal», publicado em Dialécticas Teóricas da Literatura) acerca da coexistência destas duas facetas que sempre conviveram de forma harmoniosa e regular desde o início da sua carreira de escritor.


Tudo celebrações a nível particular da universidade do Porto, Biblioteca Nacional e dos media, como o Público. Homenagem justa? Não! A possível.

Sophia continua a receber a justa homenagem até Dezembro 2019.

Sena e Sophia escreveram, foram e são lidos. São estudados, são citados. E sempre serão!


G-Souto

Fragmentos Literários

06.11.2019
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sábado, 10 de agosto de 2019

Fragmentos Culturais : 13 anos !





Ryuichi Sakamoto
credits: Courtesy Ryuichi Sakamoto CODA
via Variety


"I want to break down the walls between genres, categories or cultures."



Ryuichi Sakamoto

Ryuichi Sakamoto apresentou o seu ultimo trabalho Insen, 2005 com Alva Noto na Casa da Música, no passado dia 11 de Julho 2006. Depois da passagem pelo Coliseu do Porto, no projecto Morelenbaum2/Sakamoto com Jaques e Paula Morelenbaum, numa travessia pela bossa-jazz, confesso que as minhas expectativas eram enormes nesta actual incursão de tão conceituado compositor e intérprete.



Ryuichi Sakamoto & Alva Noto

"This global view to the different cultures is just part of my nature."



Ryuichi Sakamoto


Foi com este concerto de Ryuichi Sakamoto, ou melhor com a minha indignação sobre o que se passou com o público na Casa da Música, nessa noite de 11 de Julho 2006, que Fragmentos Culturais nasceu.

Noite de 27 Julho 2006. Uma porta entreaberta para os meus afectos culturais. Livros, concertos, exposições, cinema, teatrobailado, pinturaentre outras vertentes que me atraem, ligadas à arte e à cultura Única temática deste blog.

Treze anos? Não imaginaria que perdurasse tanto tempo! Gosto de escrever. Fujo de expor a minha intimidade. E, no entanto, ao escrever sobre o que gosto, acabo por me desnudar no concerne os meus sentimentos via cultura.

Hoje muito menos activa, na escrita. Assola-me, por vezes, a ideia de apagar. Mas é um espaço que encerra tantas lembranças! E de vez em quando venho por aqui, ainda, escrever.

Bons momentos, amistosos momentos, de partilha cultural, troca de ideias entre amigos que se fizeram e foram desaparecendo. Uns pela vida, outros pelo cansaço ou desinteresse pela blogosfera. 

Alegrias, risos. Tristezas também. Perdas irreparáveis.

A blogosfera fez parte de uma época. Pelo menos, nos termos em que alguns de nós criámos nossos espaços. Hoje, vira-se mais para a publicidade de artigos, moda, trends (palavra da nova era). Mas outros haverá ligados à cultura, política, ideias sociais ou até humor. Não duvido.





'Adagio In G Minor'/ Oil painting
credits: Andre Kohn

De vez em quando, volto aqui e (re)leio alguns dos textos que escrevi. Uns me surpreendem, apesar do tempo. Sentimentos que não consegui esconder? E que hoje, mantido o distanciamento, olho com nostalgia.

Outros fazem-me sorrir - como escrevi algumas coisas?

E outros trazem-me lágrimas ao olhar. Saudades de seres que partiram e que continuam a estar presentes em meu coração. Quanta falta da presença viva.

Sinceros momentos que tentarei deixar por aqui mais algum tempo...

Agradeço a todos os que me leram, comentaram, as palavras amigas, afectos digitais que foram poisando por aqui. E até aqueles cujo olhar se deteve por momentos, aqui. Em Fragmentos Culturais.


Até ao dia em que decida, finalmente, desligar-me deste espaço. 


Se tanto me dói que as coisas passem
É po
rque cada instante em mim foi vivo

Na busca de um bem definitivo
Em que as coisas de Amor se eternizassem



Sophia de Mello Breyner, Se tanto me dói que as coisas passem


G.S.

Fragmentos Culturais 

10.08.2019
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