domingo, 30 de setembro de 2012

Dia Internacional da Música





Picasso | Three Musicians


Mais um dia especial! Dia Internacional da Música. Embora todos os dias sejam dias de música para mim e para tantos de nós.

No entanto, poderemos relembrar  que o Dia Internacional da Música, comemorado a 1 de Outubro, foi instituído em 1975 pelo International Music Council, uma instituição fundada em 1949 pela UNESCO e que agrega vários organismos e individualidades do mundo da música.


O objectivo da celebração do Dia Internacional da Música é:
  • Promover a arte musical em todos os sectores da sociedade;
  • Aplicar os ideais da UNESCO como a paz e amizade entre as pessoas, evolução das culturas e troca de experiências.

Então, nada melhor do que deixar uma simbólica homenagem a todos quantos fazem de nossos dias caminhos únicos de sol, emprestando um doce perfume ao espírito. Os músicos.




“Não havia limite, o teclado escondia o infinito. Parecia simples, sete oitavas, não mais, um espaço tão curto que cabia dentro dos seus braços - e no entanto tinha a vastidão do mar.” 

Teolinda GersãoOs Teclados
Publicações dom Quixote, 1ª edição, Abril 1999

G-S

Fragmentos Culturais

01.10.2012
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segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Fragmentos de Outono em tons literários : Salman Rushdie !






Autumn
Kalle Mustonen

Adentrou-se o Outono. Não nos tons aconchegantes ocre-terra, mas em insólitos e chuvosos tempos cinza-chumbo. Busquei outros refúgios para compensar o desencanto de um primeiro dia de Outono tristonho, agressivo.

Pensei naqueles dois versos de Nuno Júdice:

"o outono, com a sua melancolia, empresta um estranho
perfume de terra ao espírito."

Nuno Júdice, Construção do ser, Cartografia de Emoções, 2001

Enfim! Não é um Outono assim. Não. Tão abrupta, a sua chegada! 

De volta a casa, depois de uma sessão de cinema inquietante, sentei-me, liguei o computador. Fui saltando de sítio em sítio, e eis que me deparei com dois assuntos importantes ligados às Letras. 

Respirei fundo, já mais tranquila, embora a chuva continuasse a cair, lá fora. E comecei a ler.





Colóquio Letras (online) | Setembro 2012

A partir de amanhã, dia 24 Setembro a Gulbenkian vai disponibilizar em versão digital 61 números da revista Colóquio, Revista de Artes e Letras (1959-1970). 

Um sítio web precioso para todos os apreciadores, e investigadores, nacionais e estrangeiros. Aguardo poder aceder com assiduidade. 

"Nas suas páginas podem encontrar-se textos de praticamente todos os grandes nomes do ensaio, da crítica, da arte e da literatura da segunda metade do século XX."

Em 1970, a revista desdobrou-se em duas publicações: Colóquio Artes e Colóquio Letras.

No primeiro editorial da Colóquio, Revista de Artes e Letras, pode ler-se: "Não são os iniciadores que justificam a necessidade e a utilidade de uma revista, artística ou literária, ou fazem a sua fama, mas sim os seus colaboradores e a continuidade e regularidade da sua publicação. / Lançando esta revista - Colóquio -, a Fundação Calouste Gulbenkian julga concorrer com mais um poderoso instrumento para a realização dos seus fins culturais na sociedade portuguesa. Assim se procura continuar a cumprir, sob mais uma modalidade, o pensamento do Fundador, que soube em vida - e quis que a sua obra continuasse após a morte - fomentar iniciativas ou auxiliar empreendimentos susceptíveis de dilatar as fronteiras do espírito humano."

Indubitável! É uma ferramenta fundamental para apoiar estudiosos e tantos curiosos da Literatura e da Arte em Portugal.

Tenho vários exemplares em versão impressa. Fui adquirindo-os, ora na livraria Imprensa Nacional Casa da Moeda (INCM), ora em alfabarristas especializados da cidade, quando pretendia estudar ou apenas ler algum autor ou assunto literário.

A revista contém ensaios de todas as áreas da Arte à Literatura, não exclusivamente portuguesas. 

"Mas se há que encontrar matéria de base para uma história da arte em Portugal, desde o lado mais conservador, passando pelos movimentos modernistas (sobretudo a obra de Almada e o surrealismo), até aos artistas que se revelam na década de 60 do século XX, é nesta revista que ela se manifesta."






Colóquio Letras


Se vive em Lisboa, não deixe de se dirigir à Fundação Gulbenkian, amanhã, pelas 18:30 horas, sala 1, para assistir à apresentação deste sítio web. 

Poderá também assistir ao lançamento da edição 181 da Colóquio Letras que conta com a presença de Eduardo Lourenço, Nuno Júdice e Guilherme d'Oliveira Martins.

O número abre com um dossiê dedicado a Ruben A. na sequência de um encontro sobre o escritor organizado pelo Centro Nacional de Cultura e que teve lugar na Fundação Calouste Gulbenkian, 2006. 

Nele se publicam também textos de Maria Lúcia Lepecki, Guilherme d'Oliveira Martins, entre outros.

O Expresso, no seu caderno impresso, publica uma entrevista de Clara Ferreira Alves ao escritor Salmon Rushdie





Salman Rushdie
Expresso, revista Actual Setembro 22
créditos: Autor não identificado
via CNN

Salman Rushdie relata na entrevista ao Expresso o seu exílio diário, durante treze anos, de esconderijo em esconderijo, após ter escrito Os Versículos Satânicos, na semana em que lançou o seu aguardado livro de memórias, Joseph Anton - a Memoir que em Portugal é publicado pela Dom Quixote. 




The Satanic Verses
Salman Rushdie

"A staggering achievement, brilliantly enjoyable." 

Nadine Gordimer

Versículos Satânicos foi galardoado The Whitbread Prize for Best Novel. Podem ler as várias críticas no site do autor.

Acusado pelos seus pares, segundo suas palavras, viveu o horror: "Sente-se a falta das coisas pequenas, ínfimas. A chave de casa. Não poder comprar pasta de dentes. Horrível."





Joseph Anton - a Memoir
Salman Rushdie

Foi preciso tempo para o autor conseguir voltar a "reviver o pesadelo". "Tinha medo" de o fazer, confessa. 

O acto de escrever Joseph Anton - a Memoir afastou-o dos seus fantasmas. O livro de memórias teve lançamento mundial neste mês de Setembro.





Joseph Anton - a Memoir
Salman Rushdie

Para ler a entrevista na íntegra no caderno Actual da edição impressa de 22 Setembro 2012.
Li alguns livros de Salmon Rushdie. Dois me encantaram: O Último Suspiro do Mouro e A Feiticeira de Florença (Dom Quixote). 





The Moor's Last Sigh 
Salman Rushdie






A Feitceira de Florença
Salman Rushdie
Dom Quixote, 2008

Li-os pela ordem que os enunciei. Dois livros em que o encantatório prevalece, numa escrita particularmente poética. 

Dois livros deslumbrantes, onde coexistem mouros, lendas, feiticeiras, espaços reais, personagens 'autênticas' e magias.

O mito e a realidade, os ideais filosóficos e a arte. Vasta a cultura a de Rushdie. Exuberante a sua criatividade.





The Enchantress of Florence
Salman Rushdie

Não saberia optar. Mas A Feiticeira de Florença, tradução de The Enchantress of Florence é uma belíssima narrativa que cativa de forma única a nossa imaginação estética.

E, como gosto bastante de livros de carácter autobiográfico, vou ler agora "Joseph Anton - uma memória". Talvez o livro mais esperado deste Outono.

"Esta é a minha vida e tenho o direito de a escrever".
Salman Rushdie 

G-S

Fragmentos Culturais

23.09.2012

actualizado 14.08.2022
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segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Emmanuel Nunes: um olhar






Centro Cultural e Congressos | CCC
Foto: Joana Pereira

"Após uma viagem longa, após semanas ou meses, quando se chega, (...) estranha-se as cores, estranha-se a espessura do ar, estranha-se que, de repente, toda a gente fale em português. (...) Mas, nos passeios, as pessoas avançam sem reparar em nada, fazem o seu caminho, seguem sem encontrar novidades. (...) os motoristas dos outros carros estão mal-humorados, ignoram completamente o sol de junho, que não é demasiado quente, ignoram a claridade e a temperatura perfeita."

José Luís PeixotoO vagabundo regressa a casa

Eis-me de volta a este espaço que continuo a querer partilhar, teimosamente, embora com menos assiduidade, reconheço. As  férias, essas, foram muito curtas, apesar da larga ausência.

Por vezes é bom o silêncio. Fica atento o olhar, os sons salientam-se, nítidos, os aromas mesclam-se, os livros acompanham-nos mais, os espaços culturais citadinos distanciam-se.

No entanto, o início de Setembro trouxe-nos a notícia da morte de Emmanuel Nunes.


Emmanuel Nunes
crédits: 


"Il utilise de manière virtuose les outils électroniques pour concrétiser une pensée musicale luxuriante, travaillant sur un contrepoint interactif entre partition instrumentale et programmation informatique."

IRCAM, Centre Pompidou

Não vou dizer que o conceituado músico português da música contemporânea internacional fosse acessível a um melómano comum, decerto. A música contemporânea não é fácil de entender. Mesmo para mim, que fui educada musicalmente para a ouvir.

Mas Emmanuel Nunes, compositor, pedagogo e pensador da música portuguesa no último quartel do século XX, é reconhecido por toda a Europa como um dos compositores de referência da sua geração.




Emmanuel Nunes vivia em Paris desde a década dos anos sessenta e aí morreu, segundo fontes ligadas à Casa da Música.

Na sua juventude, o compositor estudou em Portugal com Fernando Lopes Graça, Francine Benoît. E foi Jorge Peixinho que, em 1963, lhe abriu caminho para a primeira das suas viagens aos Cursos de Verão de Darmstadt.

"Em Darmstadt, através das conferências de Pierre Boulez, Henri Pousseur e Karlheinz Stockhausen, entre outros, acompanha, fascinado e envolvido, o debate estético da revolução serial, analisando as obras, absorvendo as metodologias, comparando os sistemas, discutindo os limites da linguagem."

"I learned quite a lot from the courses by Pousseur, Ligeti, and Boulez. At that time Stockhausen did not come to Darmstadt, and among the crowd of composers having a subscription to Darmstadt, two extremes were in: either the so-called sérialisme intégral, or the graphic scores tendency proclaiming their illusion of liberty. Quite often the acoustical result was nearly the same," 

Emmanuel Nunes

Fixou-se em Paris, (anos 60) e passou longos períodos em Colónia, onde teve a oportunidade de seguir regularmente os cursos de "Nova Música" fundados por Karlheinz Stockhausen


"O contacto continuado com a prática de Stockhausen, a análise que o mestre propunha das suas próprias obras e o exemplo paradigmático da sua técnica constituíram, provavelmente, a parte mais determinante da aprendizagem de Emmanuel Nunes, e os fundamentos a partir dos quais iria edificar a sua própria obra."



Emmanuel Nunes


Aparecem então as suas primeiras obras (anos 70): Minnesang para coro a cappella, Ruf, para orquestra e fita magnética, e Nachtmusik I, para conjunto de câmara com electrónica em tempo real ad libitum.

A sonoridade da música de Emmanuel Nunes é muito diversa das sonoridades a que estamos habituados, quando iniciados nos grandes compositores, hoje ditos 'clássicos' e em alguns antecessores contemporâneos. 

Como já referi, tive o privilégio de ser aluna da Professora Hélia Soveral, pedagoga inovadora, e intérprete arrojada, numa época em que pouco se ouvia falar e muito menos tocar música 'contemporânea'. 

Sempre incentivou os seus alunos de piano a abrir o seu conceito de sonoridades eruditas. 

Ainda assim, tendo, por vezes, a recusar algumas composições ou oiço-as com um certo desprazer.

E a música de Emmanuel Nunes não é fácil, logo aos primeiros acordes. É uma música estranha e, aparentemente, disforme.




No entanto, Emmanuel Nunes estabelece uma cadeia de relações entre o seu trabalho e as artes plásticas que permitem desenvolver algumas ideias capazes de lançar um pouco de luz na compreensão da sua genialidade. 

Tentei aceder à entrevista (1991) que faz parte do Centro de Informação e Investigação da Música Portuguesa, mas foi impossível.

Recebeu o Prémio Composição da UNESCO em 1999 e o Prémio Pessoa em 2000.


Emmanuel Nunes
credits:  Charlotte Oswald

Deixa obra vasta que aborda inúmeros géneros. "Do solo instrumental (EinspielungenAura...) ao gigantismo sinfónico (StrettiTif'Ereth...), passando por inúmeras combinações de câmara e de conjunto (Versus I a IIIChessed IWandlungenMusik der Frühe...), pela escrita vocal, solista, a cappella ou coral-instrumental (La DouceVislumbreMachina Mundi), pela ópera (Das Märchen) e pela música electrónica."

Territórios explorados sistematicamente, deixou um contributo inestimável e internacionalmente reconhecido, Testemunham-no, o sucesso das suas admiráveis Lichtungen, compostas no Ircam, em Paris, entre 1988 e 2007."

Emmanuel Nunes aliou à sua vida de compositor, uma actividade pedagógica intensa.

Compositores portugueses de gerações mais recentes tiveram oportunidade de enriquecer a sua experiência musical sob a orientação de Emmanuel Nunes. Músicos como António Pinho Vargas, João Rafael, Nuno Miguel Henriques entre outros.


"Plusieurs de ses œuvres ont fait l'objet d'une commande de la Fondation Gulbenkian, de Radio-France, du ministère français de la Culture, ont été jouées lors d'importants festivals internationaux et retransmises par les grandes Radios européennes."

IRCAM, Centre Pompidou




Emmanuel Nunes
Compositeur portugais, XXe siècle


A Fundação Calouste Gulbenkian acompanhou de perto o percurso criativo de Emmanuel Nunes, ao longo de várias décadas, encomendando mais de um terço da totalidade das suas peças, lista que poderá ser consultada aqui

Fez a apresentação da sua música ao longo das várias Temporadas e Encontros Gulbenkian de Música Contemporânea, promoveu e apoiou a internacionalização da sua obra no panorama europeu.

Nos últimos anos, Emmanuel Nunes manteve uma ligação forte com a Casa da Música, em estreita colaboração com a Remix Ensemble.

Em Setembro 2009, a Remix Ensemble tocou em primeira audição a obra de Emmanuel Nunes "La Douce", baseada numa curta e trágica narrativa de DostoevskyA Gentle Creature.

“Although Nunes is unquestionably the doyen of Portuguese composers, he has not lost the capacity to surprise and even shock,” 

António Jorge Pacheco

Algumas impressões sobre o processo de composição de Nunes podem ser encontradas em duas peças para piano solo, Litanies du fer et de la mer I e II. Datam de 1969 e 1971 respectivamente. Estas obras surgiram numa fase em que o compositor improvisava ao piano por longos períodos.

Ao tentar encontrar uma peça para homenagear o compositor, depois de ler a notícia da sua morte, procurava a que eu melhor sentisse (mais do que compreender arte, é preciso sentir a arte), descobri Litanies du feu et de la mer, tocada pela filha e aluna da Professora Hélia Soveral, a pianista Madalena Soveral, amiga pessoal.

Madalena Soveral está considerada uma das melhores intérpretes de música contemporânea para piano, a nível europeu.




"As I used to say to my students: It is more important for me to know what I do not want, than to know what I want."

Emmanuel Nunes


G-Souto

Fragmentos Culturais

09.09.2012
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Referências:

Emmanuel Nunes e a Fundação Gulbenkian

Emmanuel Nuness / IRCAMm Centre Pompidou

Emmanuel Nunes interviewed (2009)