segunda-feira, 9 de junho de 2014

Casa da Música : Wayne Shorter Quartet, um tributo vivenciado



Wayne Shorter | Casa da Música
créditos: Casa da Música


“To me jazz means: I dare you."

Wayne Shorter

Ontem à noite, voltei à Casa da Música. Fui ouvir Wayne Shorter Quartet. O lendário Wayne Shorter* que tocou com Miles Davis, Art Blakey (Jazz Messengersantes de se consagrar como solista da Blue Note na segunda metade da década de 60.


"During the 1960s, Wayne Shorter came to the fore not just for his talent on saxophone, but also for the compositions he created. Whether with Art Blakey’s Jazz Messengers or with Miles Davis’ quintet, or on his own string of solo albums, Shorter’s harmonic conception, sense of space and bending of music-theory rules destined many of his tunes to become jazz standards."





Wayne Shorter Quartet


Saxofonista e compositor, "a true musical giant", vencedor de vários Grammy e NEA Jazz Master Awardentrou compassadamente no palco, poucos minutos depois das vinte uma horas.


A noite estava fresca, embora o final de tarde tivesse sido agradável e bem luminoso. 


A sala esgotada desde cedo, apresentava uma audiência multigeracinal, coisa que me apraz sempre muito.


O final de dia foi esmorecendo, até que a pouca claridade que ainda se adentrava pelo grande painel de fundo que separa o coro da imensa janela virada para a a rotunda da Boavista, desapareceu. 


A sala Suggia ficou mais intimista. Como deve ser para um bom concerto de jazz.




Wayne Shorter Quartet | Casa da Música
créditos: Casa da Música


Inserido na programação Verão na Casa da Música, Wayne Shorter ocupou o seu lugar no centro do palco, perto do piano, semi apoiado num banco alto. Por baixo um tapete persa. 


Estranhei o adereço. Qualquer ligação ao músico? Ou previdência? Fiquei na dúvida.


Deu, no entanto, um carácter de bas-fond nova-iorquino, característico dos pequenos clubs de jazz dos anos 60. A julgar pelos filmes de época. Woody Allen representa-os algumas vezes em vários dos seus obras cinematográficas. Aliás, Woody Allen é também ele músico de jazz.


Voltemos então a Wayne Shorter! Fez-se acompanhar de outros nomes bem conhecidos do jazz actual, Danilo Perez (piano), Brian Blade (percussão) e John Patitucci  (contrabaixo).


Wayne Shorter, lenda feita pela composição e pela originalidade como saxofonistaregressou à célebre editora Blue Note, em 2013, com "Without a Net".





Wayne Shorter Quartet | Casa da Música
créditos: Casa da Música


O concerto iniciou-se suavemente, gestos pausados, ao ritmo dos seus 81 anos, mas com Danilo Perez a dar o mote à narrativa, bem expressivo, e Brian Blade, qual enfant terrible, a deixar escapar uma exuberância em crescendo ao longo da noite. Patitucci contrapunha cúmplice, e mais sereno.

Uma improvisação a quatro com uma potencialidade instrumental e tímbrica de elevada qualidade, criando ciclos de acção e implicação entre o virtuosismo brilhante do piano de Perez e a desarvorada exuberância da bateria de Blade, dois dos mais criativos músicos do jazz moderno que enquadraram todas as variantes instrumentais da linguagem musicak dos saxofones de Shorter.


Uma cumplicidade que se sentiu ao longo do concerto, e 
à qual se juntou uma audiência veneradora, raramente interrompendo para aplaudir, improvisações dignas de muita admiração e palmas ou assobios de apreço. Dir-se-ia mais um ambiente de master-class. Respeito pelos momentos de aprendizagem.





Wayne Shorter | Casa da Música
créditos: Casa da Música


Sobre Wayne Shorter, pouco poderei escrever sob pena de repetir tudo o que já foi escrito ao longo da imensa carreira deste senhor do jazz. Um concerto quase em tom de homenagem.

Wayne Shorter* alia uma extraordinária qualidade tímbrica nos saxofones à arte da composição! Uma das maiores referências do electric jazz.

Claramente. Um privilégio ver e ouvir Wayne Shorter, uma capacidade instrumental invejável, um talento que permanece intocável.

Wayne Shorter Quartet mantém um padrão de completa descoberta, introduzindo não só lampejos de inspiração, mas também pausas indecisas, dilemas teimosos, e longueurs inebriantes.

Apenas um encore! Queríamos mais. Mas já foi muito bom! Próprio de um músico com a humildade serena e o soprp possível, dada a avançada idade de Shorter. Mas associado à alegria e vivacidade de Perez, Blade, e Patitucci.

A Casa da Música apresentou um dos seus pontos mais altos desta época de Verão na Casa que se prolongará até Setembro.




Wayne Shorter Quartet | Casa da Música
créditos: Casa da Música


Com este concerto em que vários músicos tão celebrizados no mundo do jazz estariam em palco, falava-se de um dos melhores concertos do ano! 


E foi! No palco, cerca de hora e meia, tocou-se o mais precioso blue note jazz, como já escrevi, bem ao estilo dos clubes nocturnos nova-iorquinos dos anos 60. Respirou-se Nova Iorque! Até na postura dos músicos! 


Relembrei o concerto de Michael Formanek, outro grande do jazz, e o seu quarteto, em 2010, também na Casa da Música


E Lisboa veio de novo ao Porto, Desta vez para ouvir a lenda viva do jazz, Wayne Shorter, em concerto com um grupo de músicos de elevado mérito.

Se gostei? Gostei, claramente. Já sabia quem ia ouvir. Mas revelação mesmo, foram Brian Blade (embora não seja uma percussionista convicta, sei apreciar o talento) e o brilhante e virtuoso pianista Danilo Perez. Exuberante no teclado, sóbrio nos agradecimentos. Memórias de Gershwin, Keith Jarrett nos seus inspirados improvisos. Deram uma luminosidade muito apreciada ao saxofone de Shorter.


Profissionalismo levado a sério, mas em ambiente solto, improvisão de elevada inovação, qualidade dos intérpretes. Sonoridades puristas do jazz na sua mais livre expressão.


O electric jazz tem esse lado mais exuberante, um pouco distante, menos intimista, mas muito apreciado.


O público quase não se atreveu a exprimir durante as talentosas improvisações. Respeito. Veneração, Admiração. Tratava-se de um concerto de culto.

Sem sombra de dúvida uma plêiade do mundo do jazz actual. Com as melhores referências na imprensa escrita do jazz internacional. 

"At 81, Shorter often appears as the calm center of a roiling maelstrom, a mystical presence exulting in the improvisational lightning strikes emanating from pianist Danilo Perez, bassist John Patitucci, and drummer Brian Blade, all virtuosos and bandleaders in their own right."

sfjazz.org

Deliciei-me com o enorme virtuosismo, o talento da arte da improvisação, sim! Muito! Assistiu-se ao melhor do jazz contemporâneo na Casa da Música
Não admira, pois, tantas presenças lisboetas no concerto.


As críticas do SFJazz, All Jazz, NPR, Billboard, JazzTimes, New York Times. 
Verve, são unânimes!


Ouvir Wayne Shorter Quartet live, uma experiência única, um imenso privilégio.





Wayne Shorter
credits: Wayne Shorter official site


*Nota: Wayne Shorter morreu hoje, 02 de Março 2023, rodeado de sua família. Milhares de fãs e muitos músicos têm deixado mensagens sentidas nas redes sociais.


"One of the most prodigious composers and singular, harmonically sophisticated improvisers in jazz history, tenor and soprano saxophonist Wayne Shorter died March 2 in Los Angeles. He was 89."






Blue Note 
In memoriam Wayne Shorter


"Visionary composer, saxophonist, visual artist, devout Buddhist, devoted husband, father, and grandfather Wayne Shorter has passed away at age 89, departing the earth as we know it and embarking on a new journey as part of his extraordinary life."

Blue Note, 02.03.2023






Wayne Shorter
Kennedy Center honors 2018
credits: Getty Images


“Wayne Shorter is not only one of jazz’s greatest composers but its angel of esotericism, an enlightened and arcane elder.”

New York Times


G-S

Fragmentos Culturais

09.06.2014

update: 02.03.2023
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2 comentários:

  1. Não é feio ter inveja, neste caso, pois não???

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  2. Essa 'inveja boa' não fere :-)

    Foi muito bom ! E os músicos que o acompanharam, do melhor ! Muitos apreciadores de Lisboa estiveram na sala Suggia.

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