domingo, 1 de novembro de 2015

Voltando ao cinema : José Fonseca e Costa





José Fonseca e Costa 1933-2015
créditos : José Raposo

Não sabia que José Fonseca e Costa estava doente. E a notícia apanhou-me de supresa.  Fiquei entristecida. Uma referência do cinema que abriu claramente os horizontes da actual geração de realizadores portugueses.

Um grande cineasta. Discípulo de Michelangelo Antonioni. Admirador da Nouvelle Vague.

Era um dos meus realizadores favoritos. José Fonseca e Costa morreu hoje, 1 Novembro. 

Uma época por si só já bem triste. Perder uma pessoa de quem gostamos,  ou por quem sentimos admiração, nestes dias de Novembro, torna-se ainda mais difícil. A morte é sempre tão difícil!
Não pretendo descrever vida pessoal, Todos poderão facilmente encontrar. Prefiro homenagear o realizador pela sua obra.


What the Tourist Should See Lisbon
documentário
http://ecx.images-amazon.com/
Segui com emoção o documentário José Fonseca e Costa que a RTP2 passou esta noite. A luz no olhar foi uma das frases que lhe ouvi. Encerra uma verdade que vai para além da sua maneira de ver o olhar no cinema. Referiu, sem o dizer, a essência da alma. A luz no olhar.

José Fonseca e Costa é um cineasta de referência na filmografia nacional e símbolo de uma geração conhecida como o Novo Cinema da década de 70. Associava-o mais aos ano 80. Não sei, talvez tenha sido no final dos anos 80 que comecei a ver alguns dos seus filmes.



José Fonseca e Costa
documentário RTP2

Ouvir o cineasta ali em frente, no televisor, de olhos nos olhos, foi como se continuasse entre nós. O tom da sua voz, aquele olhar vago de busca constante, talvez alguma tristeza, envelhecimento que o magoava? 

Um documentário que reconheceu a longa carreira e a obra invulgar do cineasta português. O documentário já passara em Junho, mas só hoje o vi. Teve então mais impacto no sentir.

Kilas, o Mau da Fita, (1980) é o seu maior sucesso junto do público. Cinco Dias, Cinco Noites, (1996), O Fascínio (2003), Viúva Rica Solteira Não Fica (2006) e Os Mistérios de Lisboa (2010), What the Tourist Should See (2009), baseado num roteiro turístico escrito por Fernando Pessoa em 1925, com poemas escolhidos de Álvaro de Campos.

Estas algumas das suas obras que marcaram o cinema português do final do século XX.





José Fonseca e Costa nasceu em Angola a 27 de Junho de 1933 e veio para Lisboa em 1945. Começou por fazer crítica cinematográfica nas revistas Imagem e Seara Nova, em Lisboa, para onde se mudara em 1945.
Chegou a cursar Direito na Universidade de Coimbra, traduziu igualmente para português algumas obras, mas a sua paixão era o cinema.
Concorreu a uma vaga como assistente de realização da Rádio e Televisão de Portugal, quando esta foi fundada (1958). Ganhou o concurso, mas não chegaria a ocupar o lugar devido à sua militância política, não filiada, como fez questão de referir.

O cinesta trazia o fascínio do cinema da infância. Pertenceu à geração que via no cinema o encantamento do que não se vive na vida, vive-se no cinema. Remeteu-me de imediato para o Carteiro de Pablo Neruda. Aquele amor pelo imaginário que o cinema transmite, por vezes mais do que a literatura.

Depois continuou esse fascínio em França, a partir de 1954, acrescento em discurso directo. 


A partir de 1961, viveu em Itália onde se tornou assistente estagiário de Michelangelo Antonioni, na longa-metragem L'Eclisse. Um facto interessante, divulgado por si durante o comentário. Foi Fonseca e Costa quem escreveu a Antonioni a manifestar a sua admiração e interesse em trabalhar com o grande cineasta. E contra as suas expectativas, Antonioni respondeu, aceitando o seu pedido.

De regresso a Portugal, em 1964, produziu e dirigiu filmes publicitários e realizou  vários documentários. Só em 1972 se estreou na longa-metragem com o filme "O Recado". 
Seguiram-se Os Demónios de Alcácer Kibir (1975), As Armas e o Povo (1974).  O documentário sobre a desconolização Independência de Angola (1977) que desconhecia mas que o autor referiu no documentário.


Considerado com respeito como um dos pioneiros do Novo Cinema Português, a ele se deve o primeiro filme dessa geração. "Kilas, o Mau da Fita" (1980).  O seu maior sucesso junto do público. 



Cinco Dias, Cinco Noites, (1996), é outro grande sucesso, premiado no Festival de Gramado e nos Globos de Ouro e seleccionado para o Montreal World Film Festival.
Durante a década de 80 assinou outros títulos importantes do cinema português: "Sem Sombra de Pecado", "Balada da Praia dos Cães", adaptação do romance homónimo da autoria de José Cardoso Pirese ainda "A Mulher do Próximo".
Sem o mesmo impacto, ficaram os trabalhos seguintes na ficção, "O Fascínio" (2003) e "Viúva Rica Solteira Não Fica" (2006). 


As mulheres foram as suas personagens mais extraordinários sempre foram. "Podiam ser desvairados (como a Maria da Luz/Lucília de “Sem Sombra de Pecado”), sofredores (como a prostituta das serranias que Ana Padrão tornou inesquecível em “Cinco Dias, Cinco Noites), de uma sedução fatal (assim era a Mena de “Balada da Praia dos Cães”, fêmea sem dono) ou sobreviventes de um mar de lama (a Pepsi Rita de “Kilas”) – mas não eram fracos, nem pusilânimes, agarravam a vida nas mãos, iam em frente."

Jorge Leitão de Barros, in Expresso

Entrou no cinema com a geração do Cinema Novo, inspirado na Nouvelle Vague francesa e no Neo-Realismo italiano.


José Fonseca e Costa
créditos: Marco Borga

Foi, no entanto, um  outsider com uma visão muito própria do cinema de autor sem descurar a vertente comercial.  Foi um dos realizadores portugueses que levou mais pessoas às salas de cinema. Um excelente contador de histórias. Tal como José Pedro de Vasconcelos.

Fonseca e Costa estava a realizar o último filme, "Axilas", baseado num conto do escritor Ruben da Fonseca. Será terminado, segundo o produtor Paulo Branco.


"Lisboa, Madrid, Rio de Janeiro, Paris, Londres eram cidades onde se movia num cosmopolitismo que os portugueses da sua geração não podiam senão invejar. Ao mesmo tempo era um nacionalista africano em terra estrangeira," 

Jorge Leitão de Barros, in Expresso

Não o senti como um 'nacionalista africano em terra estranha'. Senti sim a nostagia da terra distante onde passou a sua infância.

G-S

Fragmentos Culturais

01.11.2015
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5 comentários:

  1. Aqui, no Fragmentos, se falou e recordou JFC de uma forma digna e merecedora.
    Os canais televisivos portugueses deviam colocar os olhos neste post.
    (desculpa o desabafo)

    Bem-hajas.

    Tudo de bom.

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  2. A morte dos entes superiores constitui sempre um acontecimento irreparável e José Fonseca e Costa é um criador da imagem, é um fazedor de "histórias" de que todos parece gostarem.Os artistas são sempre insubstituíveis, por isso lamento a sua perda e aqui deixo a minha homenagem.

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  3. Muito obrigada pelas tuas palavras, 'aflores'. São de amizade, claramente :-)

    Fico contente de te ler com mais frequência. Sinto saudades dos teus posts bem dispostos.

    Tudo de bom! E excelente São Martinho !

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. A morte é inanarrável, em qualquer momento... muito mais quando atinge pessoas de quem gostamos muito :-(

    A morte de José Fonseca e Costa me apanhou desprevenida. Não sabia que estava doente.

    O teu tributo, Vítor, corresponde ao que penso do inovador na arte do cinema em Portugal. Inspirou novos valores nesta área. Muito bom cinema se tem feito por cá. E o reconhecimento internacional tem sido gratificante para os novos realizadores.

    Foi com alegria que te li de novo por aqui, Vítor. Gostaria muito que voltasses.

    Bom fim-de-semana.

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